O livro que o leitor tem em mãos oferece uma perspectiva renovadora e empiricamente rica para se compreender a ação dos movimentos sociais e dos ativismos no turbilhão de acontecimentos extraordinários que, nos últimos anos, têm sido interpretados sob o signo da "crise" como se a invocação do termo produzisse efeitos explicativos. Oferece essa contribuição de um ponto de partida específico, com uma proposta analítica instigante e, felizmente, renunciando a uma tentação comum. Parte-se de um pressuposto: mal será possível avançar se as equações analíticas focarem apenas nas instituições políticas, confinando as dinâmicas da mobilização coletiva a um âmbito extrainstitucional. A conceituação de contextos turbulentos oferece a chave analítica para colocar os ativismos nas equações de modo cognitivamente produtivo: relacional, processual e centrado no papel da agência nesses contextos de horizonte histórico aberto, de elevada incerteza, e produzidos pela atuação dos atores durante sua ocorrência. Assim, a proposta convida a renunciar à tentação do determinismo retroativo, comum nos diagnósticos da conturbada vida política do país. Contextos turbulentos não têm um sentido único, nem foram enquadrados ou elaborados na prática para gerar os desfechos diagnosticados ex-post.
Por Adrian Gurza Lavalle
"'A disputa pela democracia no Brasil: Ativismos em contextos turbulentos', resultado do trabalho coletivo do Grupo de Pesquisa sobre as Relações entre Sociedade e Estado (Resocie-UnB), traz três importantes contribuições aos campos de estudo sobre movimentos sociais, ativismos e relações entre sociedade e Estado. Primeiramente, destaca-se a contribuição do modelo analítico que orienta as análises que integram o livro. Dialogando criticamente com os resultados de pesquisas e com as formulações teóricas produzidas pelas literaturas nacional e internacional contemporâneas, o modelo analítico proposto oferece recursos teóricos férteis para apreender e analisar processos nos quais enquadramentos interpretativos e repertórios de ação coletiva se (re)constroem a partir de relações marcadas por contingências, agenciamentos múltiplos, incertezas e conflitos.
A segunda contribuição do livro, tal como expressa seu subtítulo, é a proposição de um referencial teórico adequado para abordar contextos particulares conceituados como “contextos turbulentos”. Em tais contextos, elementos como incerteza e contingência tornam-se particularmente intensos, demandando dos atores a experimentação de novas ideias e práticas em busca de respostas aos desafios urgentes das “situações problemáticas” vivenciadas. Buscando ir além da ideia genérica de “crise”, o conceito de contextos turbulentos oferece um instrumento teórico útil para identificar e analisar contextos específicos, como o vivenciado no período pandêmico, nos quais a configuração da ação coletiva e da conflitualidade social assumem características particulares.
Por fim, a terceira importante contribuição do livro é a exemplificação de um modelo de produção de conhecimento coletivo e colaborativo inovador no âmbito das ciências sociais brasileiras. Mostrando a potência da colaboração para a criação de um espaço de formação científica e de produção de conhecimento qualificado, o presente livro e, mais amplamente, o trabalho desenvolvido pelo Resocie indicam um caminho promissor para a pesquisa social no Brasil."
- Marcelo Kunrath Silva
Com textos de: Ana Carolina Vaz, Anne Karoline Vieira, Ana Karine Pereira, Cleyton Feitosa Pereira, Debora Rezende de Almeida, Denise do Carmo Direito, João Victor Barbosa Ferreira, Lorena Vilarins, Mariana de Souza Fonseca, Marília Silva de Oliveira, Marina Fernandes, Marisa von Bülow, Matheus Baccarin e Rebecca N. Abers
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